sexta-feira, 23 de dezembro de 2011

O ator.

Em seu camarim ele se escondia. Olhando naquele espelho, cheio de adornos e luzes, ele não se encontrava. Ao olhar para aquele homem, aquele homem que lhe encarara por toda a vida, ele não o reconhecia.
Após alguns minutos, ouviu um barulho. Batiam em sua porta, era a hora de se arrumar. Disse que já ia enquanto vestia aquele figurino e começava  a se entender. Abriu a porta e se dirigiu à sala da maquiadora. Nos corredores via pessoas, atores, atrizes, cenógrafos, figurinistas e artistas. Sentia-se intimidado por eles, embora todos o admirassem ainda mais.
Chegando à maquiagem, entrou timidamente, acenando a todos com a cabeça. Todos surpreendiam-se com sua maneira de ser. Sentou-se em frente ao espelho, a maquiadora lhe fazia perguntas sobre qual tom ele preferia, mas ele sempre ia se mostrando indeciso, deixando a decisão por conta dela. E assim ela ia prosseguindo, pintando-lhe a cara e deixando-o ainda menos ele mesmo. Quanto mais ela se aproximava do final, mais ele se mostrava insatisfeito e ranzinza. Reclamava dos tons que ela escolhia, resmungava que ela não sabia o que estava fazendo e que ela estava machucando seu rosto. Quando terminou a maquiagem, todos que haviam adorado sua simplicidade e timidez estavam assustados com o que ele se tornou. Não por culpa da maquiagem, - a qual estava hollywoodiana, daquelas que faz os jovens entristecerem-se por não serem como o ator, e as jovens entristecerem por jamais terem alguém como o ator - mas por culpa de quem ele havia se tornado, ou quem ele realmente era.
Depois ele tinha de fazer o cabelo, sorte da moça que lhe ia arrumar o cabelo que ele tinha um cabelo levemente curto. Ainda assim as reclamações foram muitas.
Pronto, ele estava pronto. Agora era só subir no palco e impressionar a todos. Merda para ele. Apenas mais uma olhada no espelho, estava perfeito, era outra pessoa, mas agora sim ele reconhecia a si mesmo.
Subiu no palco e foi brilhante, embora não fosse ele mesmo.

O ator.

Quando ela estava prestes a ir, ele a segurou firme pela mão.
Ela estava nervosa, seu coração acelerado. Tinha medo, medo de se entregar, de se perder, de se apaixonar.
- Espere, eu preciso te dizer algo.
Ela o olhava fundo nos olhos, via aquele brilho, aquela sinceridade. Apenas meneou a cabeça, apreensiva pelo que ele diria.
- Na verdade, não é muito, eu não consigo colocar em palavras... esse tempo que passamos juntos, por menor que seja, me mudou muito, e eu já não posso imaginar um futuro, uma vida, sem você.
Pôs a mão sobre a boca, escondeu seu sorriso, não podia ceder tão fácil assim. Emburrou a face, mas se via a alegria em seus olhos.
- Eu já errei tanto, tanto em minha vida! Mas não mais, eu não cometerei esse erro, não te deixarei partir sem lhe dizer. Eu te amo, não se vá, por favor.
Uma lágrima escorreu, um sorriso aflorou. "Eu também te amo" disse ela, enquanto via o homem por quem era apaixonada beijar outra.

Os créditos subiram, e ela desligou a TV, agora que o filme acabara.

terça-feira, 20 de dezembro de 2011

Uma Santa.

Com os cabelos soltos,
o peito nu, ergueu-se.
Aos céus.

Com os olhos da cor do céu e dos oceanos
olhou-me angelicamente.

Com os borrados e rubros lábios,
beijou-me a fronte.
Sorriu.

Sem ar e sem fala
"Santa Maria"
Falei.

És divina,
como a noite passada.

Oro para que não acabe,
para que não me deixe.

Uma Santa. Minha santa.

Benzeu-me com Vodka,
beijou-me de tabaco.

E me redimiu de todos os pecados
que cometemos.
Com o puro Amor.
Amém.

Uma Santa.

Sonhei outra vez contigo, querida.
Dessa vez não foi como os outros,
Não estávamos de mãos dadas
Ou juntos desde o início.

Era diferente, eu andava sem ti,
Eu andava com amigos que nunca vi
Quando tu apareceste,
Não estavas só, vinhas com pessoas à tua volta,
E usavas um vestido branco.
Mas não, não estávamos a casar,
Usavas um vestido quase cristão,
Muito embora não sejas religiosa.

Foi nesse momento que entendi tudo,
Todos os jovens que vinham atrás de ti
Estavam a adorar-te.
Pois és uma santa, meu amor,
E é por isso que não és minha.
Sou impuro, não poderei jamais te tocar.
Sou impuro.

sexta-feira, 16 de dezembro de 2011

Coração.

Ele é simples, quatro cavidades e só, e, além disso, o sangue só entra por duas delas. Mesmo assim, como é que ele pode ser invadido tantas vezes nessa minha curta vida?
Sua função também é simples, embora importantíssima, apenas bombeia o sangue por meu corpo. E o sangue, o tão lírico sangue, o sangue que carrega tanta coisa importante: oxigênio, excretas e tantas outras substâncias. Alguns livros até dizem que ele também leva emoções por meio dos hormônios. Os hormônios são críveis, mas não são a emoção. Sou todo emoção, não apenas no sangue.
E ele bate tantas vezes por dia, ou melhor, ele não exatamente bate, ele "torce". Mas por que ele torce? Torce para que ela volte? Para que você me aceite? Honestamente, não sei o motivo, embora ele tanto torça. E torce cento e dez mil vezes por dia, ou algo assim. Ainda assim eu juro, não penso tantas vezes em ti.
Ele é essencial, ele é a base da vida. Sem ele eu não viveria, mas não pois ficaria sem o que ele bombeia, e sim porque perderia o que dentro dele está.

Coração.

O coração é um órgão muscular oco que bombeia o sangue de forma que circule no corpo. Ocorre nos anelídeos, artrópodes, moluscos e cordados.
Nos seres humanos o percurso do sangue bombeado pelo coração através de todo o organismo é feito em aproximadamente 50 segundos em repouso.
Neste tempo o órgão bombeia sangue suficiente a uma pressão razoável, para percorrer todo o corpo nos sentidos de ida e volta, transportando assim, o oxigênio e nutrientes necessários às células que sustentam as atividades orgânicas. O coração se localiza em uma bolsa chamada caixa torácica, entre os pulmões. É um órgão muscular, pode se contrair e se relaxar.

Pois vejam bem, o coração até é bem importante e talvez não seja tão simples quanto se pensa, mas não, não cabe nenhum amor nele. Na verdade, não há nada sobre sentimentos por aqui. Ele só - só - faz o sangue passar por todo nosso corpo. Mas os sentimentos são culpa - culpa - do cérebro. O coração só vai na onda dele e bate mais forte - quer dizer, ele torce - em alguns momentos, por amor e essas coisas. Enfim, o coração nos faz viver, de verdade, sem ele estaríamos mortos. Claro que sem muitas outras coisas também, mas o que quero dizer é que o coração é muito importante para entregarmos a qualquer um. Por mais que ele tenha ou não esse tal do amor, das vidas inteiras.

terça-feira, 22 de novembro de 2011

Revolução.

Eu não me importo.
Eu simplesmente não me importo.

E daí se há guerra no Oriente Médio?
Pouco me importa o Oriente Médio.

Repressão, represálias e revoluções,
Não são nada para mim.

Mas se tanto querem tentar,
Pois bem, vou também ser revolucionário.

Amanhã mesmo farei uma passeata,
"Marcha pela volta do amor".

Amanhã mesmo promoverei uma ocupação,
Eu e ela em um quarto, batendo um só coração.

Revolução.

As janelas: estilhaçadas. 
As casas: reviradas.
Carros em chamas;
Ruas destruídas.

A cidade estava dividida,
não existia mais ninguém de fora.
Muitos se uniram à causa,
muitos outros foram contra.

Era uma revolução.
Quando acabasse tudo seria diferente.
Para chegar a esse ponto,
era inevitável.

Tinham um ideal,
que podia não ser o ideal,
mas lutaram,
e isso ninguém pode negar.


sexta-feira, 11 de novembro de 2011

Julgamentos.

- Não, eu não vou jurar falar a verdade por nenhum livro nem por um país, eu falarei a verdade por ela somente.
Senhoras e senhores do júri, ela é inocente, juro que é tão inocente quanto eu, ou qualquer outra pessoa que já amou verdadeiramente.
Ao menos foi isso que aprendi nessas quase duas décadas que vivi, sou inocente. Sou sim, sempre fui tratado como tal. Desde pequeno, quando era deixado de lado nas brincadeiras, quando era posto para ser a árvore no teatro achando que era ator, e todos diziam, "pobrezinho" "como ele é inocente".
Por outro lado, a culpa é toda dela. Ela mereceu isso, era ela que dizia que me amava, foi ela que aliou-se à minha ingenuidade para assassinar minha alegria. Foi ela que disse que me amava, e que dizia coisas libertinas em meu ouvido - frases essas que, convenhamos, sequer devem ser proferidas nesse tribunal - e que quando eu, parvo, espantava-me e não onde uma garota nascida e criada em família católica aprendera aquelas palavras, dizia "Ah, como você é inocente".
Mas, bem, essa acusação não está a recair sobre mim. De qualquer jeito, meu crime é tão menos importante juridicamente quanto é mais importante realmente que o que esta jovem cometeu. Enfim, descomplicá-lo-ei: sim, eu a amei antes de tudo, sou réu confesso, eu a amei até o fim.
Talvez não devesse, mas eu sim a amei. Eu, garoto bondoso, gentil, inteligente e promissor, merecia o amor dela, ela, garota desleixada, amante da música e futura artista, não merecia o meu amor. Ao menos foi o que todos disseram: que eu era um garoto bom demais para ela, e que com ela eu não teria uma boa vida. Mas o que ninguém via era que eu sim não era bom o suficiente para ela: ela era uma garota que tinha sonhos, e eu apenas um garoto que seguia o que os outros diziam. Mas ela me salvou, senhoras e senhores do júri, ela a quem acusam veementemente, ela por quem quase morri, ela que quase me matou. Agora sou eu que corro atrás de meus sonhos, e tudo graças a esta garota. Ela mudou meu destino, então pensem muito bem quando forem decidir o destino dela.
Incrivelmente, o júri sequer precisou se reunir para discutir. O próprio juiz tomou a palavra e decidiu algo com o que todos concordaram imediatamente, a pena da jovem era simples: uma vida de amor não correspondido.

Julgamentos.

Ele falou mal do meu cabelo bagunçado, mas tem aquele penteado feio da moda.
Ele criticou meu all-star surrado, e usa um nike de cem molas.
Ela me julgou pelas músicas que eu gosto, mesmo ouvindo músicas superficiais.
Eles falam do jeito diferente que me visto, sendo que se vestem de forma idêntica.
Julgam como ajo, penso, sinto. Porém tudo neles é pior.

É incrível como julgam tanto minha vida, quando precisam é ser julgados.

terça-feira, 25 de outubro de 2011

Sujeira.

As pessoas são tão enojadas.
Qualquer sujeirinha, baratinha,
Meleca ou gosma já as faz sofrer.
Mas são apenas bactérias, nada de mais
Meus amigos, isso é tão simples,
Basta um sabonete passar.

As pessoas são tão nojentas.
Qualquer errinho, mentirinha,
Brincadeira ou hipocrisia já as faz odiar.
Mas são apenas defeitos, e nada mais
Meus amigos, tem tanta coisa em mim,
Que não é sabão que vai tirar.

Sujeira.

Não era Apocalipse,
caos,
calamidade,
desastre,
destruição,
acidente,
nem mesmo bagunça.
Com um espanador tiramos a sujeira do nosso amor,
que voltou a brilhar.

sexta-feira, 7 de outubro de 2011

O despertador que não desperta.

Tic-Tac Tic-Tac Tic-Tac Tic-Tac Tic-Tac Tic-Tac.
Trriiiiiiim!
-Bom dia. Levante-se, vá escovar esses dentes. Tic. Ótimo, e não esqueça de lavar esse rosto, tem de estar bem asseado para ir aos estudos. Tac. Vista o uniforme. Vá tomar o pequeno-almoço, torradas e chá, novamente. Tic-Tac Tic-Tac. Está na hora de sair.
-Mas não, eu não quero. Não posso ficar descansando? Não posso deixar de lado os estudos?
-Sorria. A vida é maravilhosa. Você pode ser o que quiser, contanto que seja algo que queiramos. Contanto que tenha um emprego e que seja normal. Tic. Você é livre para ir ao trabalho e vir para casa. Evidente que ficará parado no trânsito. Mas é livre. Tic-Tac.
-Mas eu não quero. Eu quero ser um artista, eu quero ser livre. Eu quero viver de poesia, de música, de arte. -Eu não quero viver desse seu dinheiro. Desse seu triste e sujo dinheiro.
-Tic. Você Tac. precisa Tic. ser Tac. como Tic. os Tac. outros. Tic-Tac. Tic-Tac. Tic-Tac. Tic-Tac. Tic-Tac.
-Eu não vou mais acordar.

O despertador que não desperta.

Com muito esmero ela deu a corda no despertador que comprara, "15 mais cedo, para caso eu não esteja acostumada com o alarme".
No dia seguinte acordou 15 minutos mais tarde, "como assim?! por quê?! despertador idiota, não ouvi seu alarme tocar!!".
No restante da semana acordou entre 10 e 30 minutos atrasada "despertador maldito, despertador que não desperta, por que eu ainda não te joguei fora?!"
No domingo ela foi dormir mais cedo, "vai que ele não desperta de novo..."
E na segunda acordou descansada e no horário, "aiai, não despertou, que bom que eu me precavi."
Nessa semana dormia sempre a essa hora, para conseguir acordar, "despertador boboca... por sua culpa estou acordando no horário que deveria, mas sem escândalos e sem cansaço."

terça-feira, 13 de setembro de 2011

Éle.

Era uma vez um poeta.
Não, mehor, é uma vez um poeta.
O útimo poeta da nossa era,
o útimo da útima fôr do ácio.

É uma vez um poeta.
Que escrevia sobre o mundo e o universo,
sobre o amor, sobre ea, a garota amada.
Sociedade, poítica e cabeo.
Precisava faar de tudo, pois ninguém mais faava.

É uma vez um poeta,
que escrevia com maestria disso e daquio.
Mas hoje quem escreve - com menos habiidade -
sou eu.

Será uma vez um poeta,
cada vez maior,
cada vez mais forte.
Cada vez mais poeta.

É uma vez um único poeta.
Hoje há só um de L.

Éle.

Dois riscos, e só.
Ou até mesmo só um, pode ser.

Se feito com a mão, é um perdedor,
Erguido aqui, bem à frente da testa.
É um perdedor, sinto te dizer.

Pode designar uma medida,
Litros e mais litros de alegria,
Litros de mais litros de amor.

Sem acento, sou eu?
Ou ele?
Não sei, mas de certo é alguém.

Se chamado, é meu amor.
Com seus rubros cabelos,
E seu sorriso torto, Éle.

Dois riscos e só,
Depois mais um u, um cê, um a e um ésse.
E pronto, cá estou.


sexta-feira, 9 de setembro de 2011

Café.

Preciso de café. Não consigo mais escrever, estou a ser derrubado por esse sono. Nada me anima, estou nessa página há horas.
Preciso escrever. Acabou meu café e não consigo continuar a pensar. Não tenho mais criatividade, ou vida, não sei, mas nada mais sai dessas outrora férteis mãos.
Preciso de criatividade. Se bem que há quem creia que não se precisa de criatividade, apenas de um escritor. Eu era um dos que acreditavam nisso. Não sei se ainda o sou. Nunca soube o que era.
Preciso saber de mim. Conheço-me em meus textos, e só. Sou o que escrevo, eu bem sei. É tão simples saber de si assim.
Não preciso de mais nada. Mas meu café acabou mais uma vez.

Café.

- Bom dia. - Disse o jovem embargado pelo sono, arrastando seus pés ao entrar no edifício.
- Bom dia, Felipe, está com sono? - Respondeu o porteiro. O garoto apenas menou a cabeça, confirmando. - Tome essa moeda e compre um café para se animar.
E antes que o garoto pudesse explicar o desgosto pela bebida, colocou uma moeda em sua mão e apontou a máquina.
Vagarosamente seguiu em direção da cafeteira, pensando que podia dar mais uma chance ao grão, afinal a última vez que tomara ainda era uma criança, e seu paladar podia mudar.
Pressionou café. Açúcar. Açúcar de novo - mesmo sabendo que é computado apenas um. Inseriu a moeda. Aguardou 1 minuto. Retirou seu café.
O vapor bailava sobre o café, e o rapaz soprava a bebida para não se queimar. Se queimou.
Soprou novamente e, com cuidado, deu o primeiro gole. Era horrível.
Olhou para Seu Mendonça, o porteiro, e sorriu. Com um gesto positivo despediu-se e entrou no elevador.
Encontrou seu chefe, que vinha do estacionamento.
- Olá, tomando um café para ter energia, vejo. - Disse com um sorriso profissional.
- Ah, sim, é bom ter disposição para o trabalho. - Falou embaralhado e tomando um gole rápido do café, para disfarçar.
E continuaram uma conversa rasa sobre os hábitos matinais pré-trabalho. E embora o menino estivesse desinteressado com a conversa e amargo com a bebida, o homem parecia estar envolvido com o diálogo; e com uma pontada de decepção disse que tinha de descer num andar antes do que desceriam, para resolver alguns importantes assuntos, mas que deveriam tomar uma boa xícara de café algum dia.
- Sim, sim, quando quiser, Senhor Carlos. - Despediu-se sem jeito, segurando a bebida com as duas mãos e tentando decifrar porque não lhe descia bem.
Ao sair do elevador jogou o copo meio-cheio no lixo.

No coffe-break tomando um Capuccino enquanto falava sobre os jogos da última rodada do Campeonato Nacional de Futebol, o jovem recém-promovido se interessa numa rapariga que lia o jornal do outro lado da sala.
- Carlos, quem é aquela? - Perguntou, acenando com a cabeça para a garota.
- Nem queira saber, Felipe, é Maria-coração-de-gelo. Todos se interessam, ninguém volta com glória. É uma devoradora de homens. - Explicou, com pesar na voz.
- Oras, derreterei seu coração com uma xícara fumegante de Macchiato, espere e verá. - Riu e foi falar com a guria.
Estatura média. Magra. Loira. Cabelos presos. Rosto fino. Sorriso curto. Olhos castanhos - de mel, como diz o clichê -. Seios pequenos. Ancas largas. Pernas compridas. Adora Macchiato.

Com duas xícaras de Mocha com a camisa dele e os cabelos soltos, sentou-se na cama.
- Ansioso para o primeiro dia, senhor Presidente? - Ela disse lhe beijando e entregando o café.
- Não queria admitir, mas sim. Foi tudo muito rápido, minha vida mudou num instante. Sinto que foi ontem que ainda era um estagiário que sempre procurava um lugar calmo para tirar uma soneca, e hoje, olha só. Presidente! De uma multinacional... Casado com uma linda mulher. Com ótimos amigos para tomar um café à tarde. Que mais eu podia querer? É realmente perfeito, sem riscos, sem surpresas, sem medos.
- Realmente, Amor, parece que foi ontem. Mas todos sabemos que você precisou batalhar para chegar onde chegou. Trabalhou. Lutou. Seguiu as regras. Você merece. - Abraçou-lhe.
- Obrigado, Querida. - Tomou um bom gole do café. - Mas estou atrasado, preciso me apressar. - Lhe beijou na testa e partiu.
- Bom dia, Felipe. Tudo que você precisa está na sala, mas sei que você dará conta do recado, caso contrário não teria passado o bastão para você.
- Obrigado, Carlos, foi um prazer ter trabalhado com você, agora vá ter seu merecido descanso. - Finalizou com abraço profissional.

Dia após dia experimentava uma variação nova de café, sempre que encontrava um exótico compartilhava com Maria e, para provocá-la, oferecia a Luisito.
- Você sabe que não fará bem a ele, é muito novo ainda para gostar de café. - Ela dizia com um tom que de sério só tinha a intenção.
- Bobagem, amo café desde pequeno. - Respondia acreditando em suas próprias palavras.
Se seus conhecidos podiam dizer alguma coisa dele seria que realmente é apaixonado por café. Espresso. Brulôt. Turco. Vienense. De todos os tipos, para todas as ocasiões. Sempre a procurar um novo aroma, um novo sabor.

Com um copo de café puro. No elevador.
Um jovem adentra o ascensor também tomando café. Soprando para não se queimar. Toma um gole e faz uma careta.
- Para se animar?
- Bom... sim, para ter forças para o trabalho. Senhor... Desculpa, não sei seu nome. - Respondeu com mais uma careta.
- Pode me chamar de Felipe. Posso lhe dar um conselho? - Perguntou tomando um gole de seu café.
- Oh, claro. A propósito, também sou Felipe.
- Pois bem, quando tinha por volta de sua idade, eu comecei a tomar café para aguentar o trabalho. E posso lhe dizer que estou onde estou hoje por conta do café, por mais estranho que isso soe. Experimentei diversos tipos e receitas da bebida, e sou um grande conhecedor, me daria bem como barista, imagino. Como ia dizendo, tomei dezenas, centenas de tipos de café, e tenho a mesma impressão do café que tive da primeira vez que bebi.
O garoto estava interessado na história do homem e mal percebera que perdeu seu andar.
- E qual é essa impressão? - Perguntou sem conseguir conter a curiosidade.
- Café é horrível. - Concluiu tomando o último gole do seu café.

terça-feira, 6 de setembro de 2011

Antiestético.

Meus dedos enroscados nos seus cabelos,
côr-de-nada, mal-tratados, emaranhados.
Sorri-me um sorriso imperfeito,
com dentes de mais.
Seu corpo, quiçá grande,
quiçá pequeno.
Seu nariz é frio,
sua mão também,
e eu não a solto.

És perfeita.

Antiestético.

É antiestético
Pensar demais.
Usar óculos, esse cabelo,
O livro na mão e essa camiseta,
Tão antiestética.

É feio
Gostar de estudar
E estudar.
Não seguir tendências
É feio.

É horrendo.
Ter preconceitos,
Julgar tanto os outros,
E não olhar para si mesmo.
É horrendo.

Mas o que é bonito?
O cabelo que todos usam?
Um poema com uma métrica tão perfeita que chega a
Doer?
Ou um poema inconsequente,
O cabelo que você decidiu gostar,
Ser como você é.
É tão bonito.



sexta-feira, 26 de agosto de 2011

Casamata.

Dia setenta e três.


Lá fora a guerra explode. Pessoas morrem, heróis nascem, traidores surgem. Mas eu estou aqui, nessa casamata que, depois desses meses já tornou-se muito mais casa.
Cá dentro tornou-se tão melancólico. Sou só eu e esse monte de suprimentos. A comida dará facilmente até o fim da guerra, mas bem que eu gostaria que ela se fosse um pouco mais rápido se eu somente tivesse uma companhia.


Dia oitenta e cinco.


Certo, não há mais salvação. Resta-me apenas ficar aqui e esperar que tudo passe, mas eu preciso de alguém. Sequer tenho acesso às notícias nesse estado em que me encontro. Será que ainda há noticiário lá fora?


Dia noventa.


Completaram-se três meses da minha vida na casamata. Resolvi pensar em tudo isso. Eu estava errado? Eu deveria ter ficado?
Ela deve estar lá fora agora. Seu nome é Fernanda. Mede 1,57m e é uma moça magra, não passando dos 44 quilos, creio eu. Apesar de franzina, Fernanda era uma garota forte. Não fisicamente, mas moralmente. Fazíamos parte de um grupo de estudantes semirrevolucionários. Ela era a líder, naturalmente. Com seus cabelos cortados à altura do pescoço era uma garota imponente, todos respeitavam aquela moça e acatavam todas suas ordens.
De certo modo, fomos nós que começamos a guerra. Éramos uma ameaça iminente à economia do país com nossos ideais libertários e igualitários. Foi por isso que o governo inventou esses atritos e fez com que o povo destruísse a si mesmo nessa falsa batalha entre nós, os "rebeldes", e grande parte da população, os "conservadores".


Dia noventa e um.


Relendo o trecho que escrevi ontem, reparei que comecei a falar sobre como tudo isso na casamata começou e acabei falando do início da guerra.
Já passava da primeira semana de conflitos. Estávamos resistindo bravamente, mas era difícil. Fernanda e eu havíamos nos separado dos demais. Em meio a toda a destruição encontramos essa casamata. Eu disse a ela que deveríamos nos refugiar na casamata, que lá estaríamos seguros. Fernanda disse-me que o povo vem em primeiro lugar. Nesse momento eu acabei cometendo o erro. Em um acesso de raiva eu resolvi descer e deixá-la ali, não podia suportar o fato de minha própria namorada me colocar em segundo plano.
Cerca de quinze minutos depois eu resolvi subir. Havia sido idiota, eu sei, ia subir e lhe pedir desculpas. O bem maior vem sempre em primeiro lugar. Ao chegar lá em cima não a avistei. Gritei por seu nome, mas Fernanda não estava mais lá. E foi assim que tudo começou.


Dia noventa e quatro.


Ao avivar essas memórias de Fernanda, tomei uma decisão. Voltarei lá para fora, batalharei junto de meus amigos. De que me importa se eu morrer? O mais importante é antes de tudo viver.

Casamata.

Não fazia mais ideia de quanto tempo estávamos no búnquer, dias, semanas,horas. Eu não aguento mais, eu vou sair, não há ninguém lá fora, por que precisamos ficar aqui, Não seja idiota, smith, lembre-se do que o sargento disse, nós não podemos nos expor, devemos esperar, eu respondi a fim de acalmá-lo, Esperar pelo quê, a guerra acabar, pelo amor de Deus, você sabe que não há ninguém lá fora, que estamos aqui sómente para não atrapalharmos, ele exclamava inquieto, Todos temos importância, até ficar nessa Casamata tem seu valor, não queira bancar o herói, O herói é aquele que não conseguiu fugir, Por isso não somos os heróis, não fugiremos, smith, ele parou por alguns segundos, como se saboreasse o que eu disse, ele olhou para o infinito e depois para os meus olhos, Você está certo, disse levantando-se, eu não vou fugir, sorri satisfeito por ter feito com que mudasse de idéia. De repente ele se levantou, correu, gritou, tentei pará-lo, ele não me ouviu, por um segundo eu pensei que estava certo, era inútil ficar aguardando uma acção do inimigo, não havia ninguém lá, o primeiro tiro cortou o ar e rasgou seu braço, o segundo perfurou sua perna, os outros incontáveis se alojaram no seu torso, em sua cabeça, ele caiu. Eu tive medo, eu continuei escondido, não podia fazer mais nada, ele estava mortinho da Silva, imagino que eles também estavam a esperar por muito tempo, tinham sede, um se levantou e foi adiante, o outro atrás, mais que um compromisso, mais que uma questão sobrevivência, em segundos dei cabo dos dois, eles mataram meu amigo, meu amigo se matou, e até segunda ordem eu continuarei nessa Casamata.

terça-feira, 23 de agosto de 2011

Cabelos.

Os seus cabelos côr de cobre não saem de minha cabeça,
o toque macio, o perfume adocicado.
Com meus dedos trançados, olhos fundo nos seus olhos.
Que brilham, refletem os meus, sorriem.
Sorriem, você toda sorri,
com seus lábios de cereja,
os quais não posso resistir.
E todo o seu corpo, seu delicado nariz - que eu adoro.
Sua cintura, suas pernas, seus braços, suas mãos.
Cada parte de ti, cada pedaço seu.
Que eu quero para mim,
que eu não posso esquecer.

(Não pude me ater apenas a seus cabelos
adoro-te toda.)

Cabelos

Criticaram meu cabelo.
Disseram que estava feio:

"Corta esse cabelo, Lucas,
Vai cortar, deixa um pouco mais curto.
Assim tá feio, ele esconde todo seu rosto."

"Enobreça sua mente,
Vá ler um livro, deixar de lado a televisão,
Assim está burro, ela esvazia toda sua mente."

Eis o que eu devia ter respondido ao acéfalo,
Ou algo sobre eu gostar de meu cabelo assim.

Mas calei-me, sempre calo-me.
Não por ter tido vergonha ou qualquer coisa,
Apenas não queria dizer a grande verdade:

"Ela gostava assim."

sexta-feira, 19 de agosto de 2011

O Violinista.

Todos os dias no mesmo horário eu ouvia um violino a ser tocado. Aquelas preciosas notas invadiam minha casa e caíam sobre o papel no qual eu escrevia. De início eu costumava ficar - por falta de melhor palavra - assustado. O violino invadindo-me tão repentinamente, tirando-me do meu tão habitual sossego. Eu me perguntava quem estaria a tocá-lo, seria um rapaz, uma moça? Um músico profissional, um estudante? Por fim eu jamais cheguei a descobrir quem era que trazia aquela música à vida, não que isso tenha sido de suma importância para minha relação com o violino e o violinista, eu segui a amá-los intensamente.
Certa tarde eu estava a escrever e esperava ansiosamente pelo violinista, ouvir suas melodias tão alegres, seus tons tão melancólicos e com isso escrever versos e mais versos, sempre inspirado naquela canção que vinha pelos ares. Mas o tempo passava e nada do meu amigo violinista entrar em ação. Eu esperava por seus pizzicatos, ansiava por talvez um, apenas um, col legno, mas não vinham. Nada de violino, nada de violinista. E o que eu faria sem minha música? De onde tiraria eu a inspiração para meus sonetos? E, assim como tudo se iniciou, chegamos a um fim. Nada de música, nada de violinista.
Desde então, sempre que ouço um violino lembro-me das etéreas tardes que passei a escrever a esse som. Quanto ao problema de não conseguir escrever sem esse fundo, superei-o facilmente, toda vez que tomo a caneta em minhas mãos a sinto como um arco, enquanto as folhas são as cordas e, por fim, musicalmente escrevo.
Hoje eu estou bem, consigo viver sem meu violinista, apesar das saudades, mas mesmo assim, pergunto-me onde ele estará, se alguém o ouve e se esse alguém o sente como eu sentia. Tenho saudades do violinista.

O Violinista.

A corda vibrava melancolicamente. Aquela longa nota aguda que anunciava o início duma nova canção.
Nunca ensaiava, a música era sua expressão, a janela para sua alma, e não existe ensaio para nossos sentimentos. O reflexo de seu coração, era isso que o violino significava-lhe. Ele só queria ser ouvido, queria que alguém - qualquer um - parasse e lhe desse atenção - apenas um segundo! -, só não queria ficar sozinho.
E, em verdade, sozinho não estava, era mui talentoso, com habilidade a sobrar-lhe, indubitavelmente um ás, e cada vez mais aglomeravam-se fãs seus, admiradores da fina e aristocrática música clássica. Mas solitário sim, sempre esteve e tinha plena certeza de que sempre estaria. Rodeado ou não, com um ou cem pessoas a escutá-lo, era solitário, sem alguém para dedicar suas canções.

Um som de piano podia ser ouvido onde sempre estivera o violinista. O violinista podia ser visto onde normalmente algum fã estaria a ver sua performance, geralmente uma bela garota a qual o violinista nunca notara, mas dia após dia estava lá, a sonhar, a criar coragem. A bela garota podia ser observada a tocar a mais bela e melancólica canção que o violinista ou qualquer outro já ouvira.
Agora ele a notava, mas por ser um músico, a conhecia pelo ouvido. Cada nota era um fragmento de sua história, um pedaço condensado de seus sentimentos.
Tirou seu arco, pegou seu violino e tocou uma música semi-alegre, uma tristeza com gosto de esperança. Ela parou por um segundo, fitou-o, sorriu-lhe. Acompanhou o ritmo da música, que cada vez mais alegrava-se. Acelerava, e contagiava - não os espectadores, mas um ao outro.
Alta, barulhenta, ruidosa. Foram perdendo o ritmo, a graciosidade, estavam a gargalhar sem se importar com partituras ou melodias. Pouco a pouco, aqueles que pontualmente reuniam-se para ouvi-lo partiam. Resmungando, praguejando, incomodados com a felicidade e o verdadeiro amor.

terça-feira, 16 de agosto de 2011

Ode à derrota.

Congratulo-vos,
congratulo-nos.
Por todas as conquistas,
por todos os louros.

Ao ser victorioso, não se tem dificuldades,
sem dificuldades, não há glória.
Ao ser um perdedor, só conhece os obstáculos,
com os obstáculos, aprende a superar-se.

Parabéns a todos os perdedores,
que mesmo só conhecendo a derrota continuam a lutar.
Que mesmo só conhecendo a decepção, continuam a sonhar.
Um brinde, e uma ode à derrota.

Ode à derrota.

Sou gênio
Quando não penso.
Canto tão bem
Calado.

Sou o menino que perdeu,
O menino de quem o mundo diz ter dó
E pelas costas desata a rir-se.

Sou motivo de tristeza,
E ao mesmo tempo ela mesma.
Uma lágrima e um sorriso,
Uma mentira e um desabafo,
E sempre ao inverso.

Sou o menino que prefere gostar do que gosta,
A ser aceito e bem visto.
Que não espera agradar,
E pouco importa se não o fizer.

Sou como uma figura disforme,
Escondida detrás de um tecido translúcido.

Sou nada, e isso é tudo.

terça-feira, 2 de agosto de 2011

Gravidade.

Eu parecia mais leve,
como se caminhasse sobre neve.

Eu saía do chão,
e precisei que me dessem a mão.

Todos ao meu redor não foram afetados,
mas eu flutuava, cada vez mais alto.

Tentaram me pegar com um salto.
Mas foram muito demorados.

Eu subi, e subi
subi.

Lamentaram minha perda,
mas nunca souberam que lá do alto,
finalmente eu pude ver a vida toda por um novo ângulo.

No dia que faltou gravidade.

Gravidade.

E eu que queria voar,
Queria ser,
Ou ao menos viver.

Queria ir além,
Mas não posso partir, meu bem.
E disso não posso mais me livrar.

sexta-feira, 29 de julho de 2011

Ovelha Negra.

Em uma casa campesina havia um jovem, esse jovem era um pastor, ele queria ser um bom pastor e impressionar a todos os outros pastores da região.
Em um certo dia comum saiu de casa o jovem, ia pastorar como em todos os dias, saiu com seu cajado à mão, levou as ovelhas ao pasto, elas pastaram como sempre iguais, durante o retorno reparou em uma ovelha em particular.
Em outra manhã saiu novamente, foi pastorar como sempre, mas com uma sensação diferente, atentava para a ovelha diferente, para como ela era diferente, e como ela gostava de ser diferente, ela não se importava para o que pensavam dela e seguia sua vida assim.
Então o pastor mudou, nunca mais seria o mesmo, não procuraria mais tentar agradar ou impressionar os outros, ele seria diferente, e não se importaria com isso.

Ovelha Negra.

Seis, seis, seis, sete, seis, seis.
"Eu preciso só de um seis pra passar de ano." Ele dizia.
"Mas seu irmão não tirou nota menor que oito." Seus pais respondiam. "E quando sua irmã estudava também tirava no mínimo nove."
Mas ele não se importava, tinha coisas mais importantes a fazer. Andar de skate, ficar com seus amigos, tocar violão, coisas importantes.
"Por que você não vai praticar algum esporte? Seu irmão ganhou medalha de ouro no último torneio de futebol interescolar, e sua irmã é ótima no xadrez."
"Eu já sou foda no videogame, e xadrez nem é esporte."
Mas ele não se importava. Ele vivia sua vida tranquilamente, sem querer superar seus irmãos, sem competir.
Ele era a ovelha negra da família, mas não ligava.

terça-feira, 26 de julho de 2011

Laranja.

Acima de mim laranja
mas não pode ser, o céu é azul não laranja.
Ela me disse que algo amanheceu fora do lugar,
eu não sabia se era em mim ou no mundo, e preferi não perguntar.

Continuei meu dia, ligeiramente diferente,
mais laranja.
Abri a torneira e, novamente, surpresa.
A água que escorria - ao invés de incolor -, sim, laranja.

Eu não sabia como reagir. Era tudo
tudo tão estranho e normal.
Era laranja, mas não fazia bem nem mal.
Só era laranja.

Na dúvida eu corri,
ri.
As árvores, os cães, a rua e as nuvens.
Laranja, laranja, laranja, laranja.

O cinza da cidade agora era laranja,
os táxis amarelos, laranjas e laranjas.
Mas as folhas outonais das árvores marginais, como estariam?
E para minha surpresa, laranja também eram.

Cansado desse enigma sem sentido,
na beira do lago me vi refletido.
Na água laranja eu vi algo ainda mais espantoso,
um sorriso flagrante no meu rosto!

Acordei.
Então era um sonho, nada mais que isso.
Fui tentar me levantar mas estava preso,
você ainda me segurava,
e eu dei um beijo de bom dia nos seus lábios laranjas.

Laranja.

Eu sempre fui diferente,
Um garoto laranja entre gente normal.
E ser laranja, convenhamos
Nunca foi coisa legal.

Num mundo de gente doce ou azeda,
Eu era ambos.
Mas não me encaixava, eu não fazia parte,
Era odiado por todos.

Sou laranja, e gosto de laranja,
Mesmo que nunca venha a ser como o vermelho,
Uma cor quente e tocante,
Gosto do que vejo no espelho.

Eu amo laranja, e sempre amarei,
Sou assim dos pés à franja.
Eu amo laranja, mas os outros não,
Porque, acima de tudo, ninguém fica bem de laranja.

sexta-feira, 22 de julho de 2011

A Fuga.

Em outro dia pedi ao destino que me deixasse te encontrar para fugir de minha vida, mas agora pergunto-me “E se a encontrasse?” Ao primeiro momento eu faria uma piada infantil, como sempre fiz. “Ainda está viva?” Você riria, diria que eu também tenho andado sumido. Eu comentaria seu visual. Estaria linda, sempre está. Você perguntaria “O que está ouvindo?”. Eu tiraria o fone do ouvido oferecendo-o a você e diria “Você vai gostar, me lembra você.” não importando o que fosse, mas me lembraria, tudo me lembra. Você acharia divertido, sorriria tímida, nunca soube reagir bem a meus elogios. Emudeceríamos então, ficaríamos parados um em frente ao outro, meio incómodos. Eu não teria nenhuma atitude, nunca tive mesmo, apenas a olharia, apenas a admiraria. Eu seguiria em frente, diria que “Temos de fazer isso outras vezes.” Você concordaria, mesmo que não achasse o mesmo, apenas por educação. Ou talvez eu congelasse ao vê-la e você fugiria de mim e de seu passado.
Ou mais do que isso, dizem que se deve fugir do amor, eu devo então deixar de pensar você. Nada de músicas que você me mostrou, nada desenhos que você fez, nada de querer te encontrar. Seguir em frente, escapar do que fomos, nunca mais olhar para trás, sem arrependimentos. Ser como você sempre foi, inconsequente, mas da melhor maneira possível.
Como você é... pronto, já me encontro pensando em você de novo, como eu sempre fui... apaixonado por você. E é natural que eu pense, é possível que eu te amassa inatamente, antes mesmo de te conhecer. E mais, não haveria como não pensar na garota que me fez me sentir vivo, na primeira garota que me tratou como alguém, na única garota que disse que me amava, - mesmo que não fosse verdade, e não era, nada é verdade quando se é jovem - na garota da minha vida, apenas isso. Não haveria como não pensar em você, não haveria como fugir de você sem fugir de mim mesmo.
Não, não há como fugir do amor.

A Fuga.

Os passos espalhavam água por toda a rua encharcada. O cheiro era de verão, com gosto de chuva rápida. O sol caía do céu lentamente, em câmera lenta, repleto de dramas. Os passos eram nervosos, confusos, indecisos. Ela sofria e, por isso, corria; fugia; abandonava.

Tudo parece calmo, sem surpresas, sem novidades. Era morno, habitualmente morno. Todos tinham aquele sorriso sem graça, de quem já não sonha mais. "Estamos arrasados? Não temos motivos para sermos felizes? Desistimos?" Pensara antes de correr.

Correu, correu, ninguém percebeu. "Não sou como eles. Sou melhor que isso. Melhor que eles. Eu serei feliz, sozinha!"

Era sua fuga. Só sua. Mas o que era esse gosto de vazio? Essa sensação de derrota? A pior colocação no primeiro lugar do pódio.

Ela corria e deu de cara com um beco sem saída. Deu meia volta. Quanto mais andava, maior ficava o buraco em seu peito. Um passo a mais, uma pá a menos. Não aguentou mais, cedeu. Ofegava, seu coração apertado e gelado.

Percebeu afinal, tentava fugir da dôr e da tristeza. Mas a causadora perseguira-lhe até lá.

Sua fuga foi completamente em vão. É impossível fugir de si mesmo para ser feliz. Somente enfrentar-se.

No beco sem saída, ela seguiu em frente.

terça-feira, 19 de julho de 2011

Anedota.

Aprendi uma nova piada, a vocês vou contar.
Toc-Toc! Quem é?
Ninguém! Ninguém quem?
Ninguém nunca vem me visitar.

Anedota.

Nunca soube contar anedotas,
Nunca fui engraçado.

Sempre quis ser cómico,
Fazer você sorrir.

Eu seria cómico,
Se utilizasse da auto depreciação?

Talvez devesse rir de mim mesmo e de meus defeitos,
Fazer piadas sobre minhas decepções.

Eu a animaria, seria cómico,
Se não fosse irremediavelmente trágico.

sexta-feira, 15 de julho de 2011

O bobo da corte.

Era uma vez um bobo da corte que vivia a entreter o rei e toda a realeza de sua nação. Ele era adorado em seu pequeno país, fazia com que todos sorrissem e rissem sem parar. Vivia causando uma constante alegria e uma vida de felicidade no reino.
Com o tempo sua fama foi aumentando, pessoas vinham de todo o mundo ver o tal bufão, apenas para dar boas risadas às suas custas. O bobo da corte fazia rir quem apenas chorava, resolvia problemas e acabava com guerras.
Foi depois dessa imensa fama que ele obtivera que veio um convite do rei do maior império do mundo para que o bobo fosse trabalhar em seu império. Todos da pátria do bobo ficaram orgulhosos, incentivaram-no para que ele fosse aproveitar tal glória mas ele recusou, queria apenas ficar em sua casa, queria sorrir novamente, pois desde que se tornara bobo da corte nunca mais conseguira resolver seus próprios problemas muito menos ser feliz mais uma vez.

O bobo da corte.

Há muito tempo existiu um rapaz brincalhão que adorava brincar de rir. Fazia piada com todos ao seu redor, que também se divertiam sem ligar quando eram o foco das brincadeiras, afinal ele também fazia consigo mesmo e todos levavam com bom humor.
Se perguntassem uma característica dele, diriam que ele era engraçado, e é isso que era. Era um gênio, todos gostavam dele, todos riam com ele, chegavam até a admirá-lo.
O tempo passou e sua fama cresceu, era tão engraçado, tão bem humorado, tão divertido. Claro que em alguns momentos ele ficava triste; preocupado; desanimado, ele era humano, afinal, mas encarava descontraidamente.

Até que um dia o rei o chamou ao castelo.
- Meu jovem, ouvi dizer que és o mais engraçado de todos, é verdade?
- Olha, Seu Rei, eu até podia fazer uma piada sobre isso pra provar que sou, mas a piada aqui é eu manter a seriedade e não chocar ninguém fazendo uma anedota diante de vossa majestade. A reviravolta é não ter reviravolta, sabe?
- Hahaha, você é bom, garoto. Doravante será o bobo da corte do reino, e ganhará a vida fazendo os outros rirem, que achas!?
O bobo da corte não respondeu, apenas abriu um grande e belo sorriso. O primeiro sorriso falso que já dera, que marcava o fim dos verdadeiros.

terça-feira, 12 de julho de 2011

Menino-poeta.

Mas na verdade eu ainda sou menino.
Só quero brincar, me divertir.
Não quero trabalho e compromisso.

E por outro lado, quando penso em você.
Quando penso e sinto, é só o que quero.
Seu amor, eternamente.
Essa chama ardente, que aquece meu peito.

De um lado a diversão inconsequente,
do outro o coração carente.

Eu sou um pouco dos dois,
por você e por mim.
Não há uma escolha correta
sou mais um menino-poeta.

Menino-poeta.

Em um citadino ónibus,
Uma garota adentrou.
Era alta, tinha cabelos loiros,
Belos olhos e um sorriso sem cor
Vestia um suéter verde,
E tinha beleza que às outras excede.

Ao adentrar, um garoto ela avistou.
De camisa negra, cabelo desgrenhado,
Sorriso murcho e olhar desinteressado.
Ele também a notou,
Sentiu algo diferente até ela desembarcar.
Depois retornou à sua vida, esqueceu-a sem hesitar.

Partiram, cada um em sua direcção,
Ele nunca mais viu aquela moça que tocou seu coração.
E ela nunca saberá o quanto ele a amou
Que ele era a personificação de seus sonhos,
Que ao chegar em casa sobre ela versejou,
Que ele era apenas um menino-poeta.

sexta-feira, 8 de julho de 2011

A Partida de Futebol.

Me parecia uma coisa qualquer, só um entretenimento para as pessoas, sem nada de especial ou profundo. Eu, que sou tão acostumado à arte, à literatura e à música, não via nada de especial ou tocante naquilo.
Era um bando de homens crescidos agindo como crianças, basicamente isso. Um bando de homens correndo atrás daquela esfera e tentando empurrá-la dentro de uma das metas, e um outro bando gritando para que o primeiro bando desempenhasse bem sua função.
Mas não era exactamente isso, embora o primeiro bando ganhasse milhões para fazer aquela função quase troglodita, havia um sentimento envolvido em todo esse processo. O segundo bando amava isso, alguns de maneira irracional e exacerbada, mas amavam. E, mais do que isso, o processo também promovia o bem. Ao conhecer mais o assunto pude ver que não era apenas uma coisa qualquer, era muito mais do que isso. Fiquei sabendo que havia gente que morria por aquilo, não apenas no sentido figurado, um integrante do primeiro bando que fora assassinado devido a um erro que cometera em sua função. Soube também que havia gente que vivia apenas por aquilo, uma equipe pertencente ao primeiro grupo que, mesmo em meio a uma guerra, usou deste suporte para mostrar no que ainda acreditava.
Podia até parecer coisa pouca, uma mera partida de futebol, mas ia além.

A Partida de Futebol.

Meu pai era um homem sério. De trejeitos pitorescos, e modos semi-rudes. Era seu jeito de ser, sua natureza, naturalmente parrudo. Na verdade, ele era muito fechado, eu não sabia muito sobre ele, nem ele sobre mim. O que eu posso falar sobre ele? Ele é forte - não somente fisicamente -, trabalhador, e ama futebol. O último item é o que eu estou mais certo de ser verdade.
Era 13 de Julho de 2014, todos estavam reunidos em casa para o grande evento do século. O bairro inteiro vestido de amarelo em frente a TV da sala. Meu pai lado a lado com o nosso vizinho que ele tanto odiava, o engraçado é que eu sempre os achei muito parecidos, e imagino que seriam grande amigos, caso um não torcesse para um time verde-e-branco e o outro para um branco-e-preto.
Era 13 de Julho de 2014, mais precisamente às 17:48 e o time de Amarelo estufou a rede to time azul. O país foi a loucura, festa, fogos, muita gritaria e ofensas - chacotas - jogadas ao ar. Fogos, festa, alegria - muita alegria - por uma bola que foi chutada por cima de uma linha.
Eu não entendia muito bem por que tudo isso, mas eles estavam felizes. Eu ainda não entendo hoje, mas lembro da seguinte cena: O homem de preto pegou a bola, levantou o braço direito, apitou. Os amarelos festejaram, os azuis lamentaram. Meu pai abraçou o vizinho e, pasmém!, chorou. Meu pai chorou.
Eu ainda não entendo o futebol hoje, mas aquela partida de futebol me mostrou que não é para ser compreendido com a cabeça, e sim sentido com o coração.

terça-feira, 28 de junho de 2011

Ruas Paulistanas.

Caminhando pelas Ruas Paulistanas,
conheci uma garota diferente;
Era uma tarde de Outono:
Dia 13 de Maio.

Augusta,
cabelo amarelo, all-star azul.
Camisa xadrez, piercing na boca.

Entretinha-me tanto,
com seu jeito diferente de falar,
seu leve modo de andar.

Augusta,
Por que me abandonou?
Era o centro de minha vida, e nada restou.

Luis Antônio,
um skatista divertido e descolado.
Não hesitou para se entregar,
para partir meu coração.

Augusta, Augusta.
Uma garota Paulista.
Que me deixou no Paraíso.

Augusta, Augusta.
Ainda te vejo em cada esquina,
em cada rua dessa cidade,
nas Ruas Paulistanas.

Augusta, Augusta
Me levou ao Paraíso,
Mas no final foi Consolação.

Ruas paulistanas.

Passei mais uma tarde
Triste por meio das ruas
Paulistanas solitárias
Sofriam em meio à obscura
Neblina se romântica,
Fumaça se realista.

Uma tarde tão paulista
Na cidade tão cinza
A noite vinha caindo
Sozinha vinha a vida
Pensativa se intelectual,
Lúgubre se melancólica.

Em todas tardes paulistanas
Ruas se enchem de cores
Tristes e felizes, disjuntas,
Dizem que podem coexistir,
Juntas se harmónicas,
Repelindo-se se desafinadas.

sexta-feira, 24 de junho de 2011

Dois amigos.

- E aí, o que vamos assistir, idiota? - Ela disse enquanto paravam na frente do cinema.
- Ah... Não sei, deixa eu ver o que tá em cartaz. - Respondeu o garoto enquanto analisava os filmes na bilheteria.
- Eu queria ver o filme hoje, sabe? - Disse em tom de deboche e deu um soco no ombro do rapaz.
- Haha, como você é engraçada. Por que não ajuda a escolher então, já que tem tanta pressa? - Ele falou apontando para os filmes.
- Claro, claro, eu tenho que decidir tudo pra você . Bom... Não me abandone jamais?
- Quê? Nunca ouvi falar, próximo.
- Piratas do Caribe! Piratas do Caribe, por favooor. - Pediu fazendo bico.
- Credo, nem implorando.
- Chato. Meia-noite em Paris? Ah, não, parece ruim.
- Parece bom. - Disse sorrindo.
- Ruim. Se beber não case 2, eu ri bastante do primeiro.
- Eu nem vi o primeiro.
- Assim você dificulta, sabe?
- Sei sim, é como eu me divirto.
- Já achei. Esse é a sua cara. Carros 2.
- Carros 2! Animação. Diversão!
- Ok, ok. - E virando-se para o bilheteiro que esperava pela decisão dos amigos pediu dois ingressos para o filme.

- Odeio trailers. - Ela disse soprando sua franja como se entediada.
- Odeio sair contigo. - Ele disse tomando sua Coca.
- Então não saia, ninguém te obrigou a aceitar. - Respondeu pegando a Coca da mão dele.
- Calma, besta. Era brincadeira. - Estava nervoso, ansioso. - cê sabe que eu curto sair contigo, você é uma das minhas melhores amigas.
- É, e você é o um dos meus melhores, eu também tava brincando... - Ela notava seu nervosismo, sempre notava. - Relaxa.
- Ok... É só que... cê sabe. - Era apaixonado por sua amiga. Perdidamente. Eternamente. E isso era horrível, mas não podia evitar. - Deixa pra lá.
- Argh, pare com isso. - Ela se inclinou para frente. Ele se assustou.
Ela se aproximava devagar, seus olhos de encontro aos dele, que estavam arregalados. A respiração forte, o coração rápido. O mundo começou a girar cada vez mais lentamente. Ele não tinha reacção. Mas ela sabia o que estava fazendo, como sempre.
Tocaram-se. Seus lábios colados, quentes. Ela era macia, doce, e quente, sempre quente. Ele era receoso, apaixonado, e quente, com ela. Ele fechou os olhos assim que o mundo parou. Ela começou a se afastar e então estalou seus lábios com o dele, olhou-o nos olhos, sorriu, sentou-se no seu lugar.
- Eu sei que você queria isso... desde...
- Sempre? - Ele sugeriu enrubescido.
- É, tipo desde sempre. - Ela concordou meneando a cabeça. - Enfim, desde sempre. E, sei lá, você é meu amigo, amigos querem ver os outros felizes... Mas eu estou com outrem agora, cê sabe. E você é meu amigo, só meu amigo. Espero que entenda. - Terminou colocando as últimas palavras cuidadosamente na frente do rapaz. Procurando não derrubar a pilha de sentimentos que ele tinha de equilibrar quando estava com ela.
- Sim, eu entendo. - E ele realmente entendia, estava leve como uma pluma que alçara voo com um sopro de vento quente de uma tarde de verão. - Eu entendo, você é minha amiga, somos amigos, só amigos. Aham. Você é tipo, minha melhor amiga, cê é incrível, boba. - Sorriu e virou-se para o telão. - O filme já vai começar.

E assistiram ao filme, riram, brincaram, divertiram-se. Eram dois amigos. Dois verdadeiros amigos. Apaixonados pela amizade um do outro. Renovando e descobrindo o que é a amizade.

Dois amigos.

Era uma vez um garoto, sua vida não era um faz-de-conta, longe disso. Sua vida não era doce e brilhante, sua vida era triste, cinzenta.
Esse garoto tinha diversos amigos, ou melhor, diversas pessoas que lhe chamavam de amigo, pois para ele não passavam de colegas.
Haviam colegas de escola, aqueles que sequer ligavam para ele em nove de cada dez casos, e o décimo caso configurava uma véspera de prova de uma matéria que o garoto dominava com mestria. Ele jurava que pararia de falar com eles, que a qualquer hora perderia a paciência e diria o quanto os repudiava.
Haviam os colegas de trabalho, aqueles que sequer ligavam para ele na maioria dos casos, e só interagiam com ele quando era realmente necessário. Estes ele respeitava, ao menos não fingiam gostar dele.
Haviam alguns amigos - ou coisa parecida -, aqueles que gostavam dele, que andavam com ele não apenas por interesses. Destes ele gostava, os respeitava, mas sabia que não tinha algo verdadeiro quando percebia que nada sabia sobre eles e eles nada sobre ele.
Haviam os amigos sazonais, aqueles que surgem de repente, formavam um forte vínculo com ele e iam embora. Destes ele também gostava, mas conseguia viver sem eles após a partida.
Havia por fim uma amiga isolada, aquela que era tudo para ele, aquela por quem ele morreria, ela sabia tudo sobre ele e ele tudo sobre ela. Ele a amava, ela também o amava mas, diferentemente dele, ela tinha outros amigos verdadeiros e costumava deixá-lo de lado. Nesse caso ele acabava sem ninguém, ou com amigos falsos, o que é ainda pior, e esperava conhecer alguém novo, não eram necessários milhões, mas pelo menos dois amigos verdadeiros.

terça-feira, 21 de junho de 2011

Educação.

A educação é superestimada.
E eu sou o monstro que ela criou.

Na escola nunca aprendi a ter compaixão,
não com essa tão chamada educação.

Nós não precisamos de educação.
Nós não precisamos de controle da mente.

Resolvo facilmente qualquer problema matemático.
Mas resolver meus problemas sociais seria mais prático.

A educação é superestimada.
E eu sou o monstro que ela criou.

Nunca aprendi nada sobre amor, amizade, pena ou compaixão.
Somente sua definição.

Na escola eu aprendi sobre o pretérito imperfeito,
mas não está nas apostilas como esquecê-lo.

Nós não precisamos de educação.
Precisamos de coração.

Educação.

A educação é um complexo.
Simples e directo.
A educação tenta impor aos jovens o que não querem.
Confuso e assustador.
A educação apenas assusta os estudantes.
Preocupante e intrigante.

Os jovens são o futuro.
O único futuro.

A educação é superestimada.
Eu sou uma pessoa monstruosa
Que foi por ela criada.

sexta-feira, 17 de junho de 2011

Trilhos.

Ela entrou na estação que dava início a toda a linha, ou na estação que findava a mesma linha, conforme sua visão. Comprou sua passagem para o trem que logo partiria, "Uma provável passagem para uma vida nova." pensou.
Dirigiu-se às catracas, e quando passou sentiu que não deixava somente o lado de fora da estação, deixava uma vida inteira para trás. Erros, fracassos, sentimentos que jamais deveriam ter aflorado. Ela tomaria um novo sentido. Ela finalmente faria sentido.
Ficou a pensar na plataforma sobre o que seria aquela nova vida. Trilharia um novo caminho, estava bem certa disso. Não estava certa de que caminho era esse, apenas estava certa de que ele diferia de qualquer outro no qual caminhara por toda sua vida.
Entrou no trem.
Tomou um lugar ao lado da janela. Tomaria vento, veria tudo. Adorava lugares à janela, considerava-os ideais para alguém observador como ela.
Abriu seu livro. Algo semi-intelectual, uma literatura daquela que os jovens leem justamente para não compreender.
Fechou seu livro. Já havia o lido por três quartos de hora, o suficiente para enevoar a mente. Haveria de achar alguma outra coisa para fazer sobre aqueles tediosos trilhos. Queria algo que não encontrava em si.
Uma moça trouxe-lhe em um daqueles carrinhos algo para beber. Ela recusou. Ironicamente, agora não queria nada.
Passou-se mais um quarto de hora. Resolveu contrariar-se mais uma vez ao dirigir-se ao vagão onde eram dadas as refeições. Sim, voltara a querer algo. Ela era assim, apenas uma jovem, uma constante contradição.
Sentou-se a uma mesa qualquer. Pediu um prato que não importa junto de uma bebida ainda menos importante. Levou à boca o primeiro pedaço daquela refeição, parecia frio mas não estava, era apenas sua sensação.
Levantou os olhos, cansara-se da comida medíocre. A primeira coisa que avistou foi a última que deveria lá estar. Ela sentiu tudo aquilo de novo. E de novo.
Descarrilou.

Trilhos.

Sempre seguindo os trilhos, eu viajava para o meu destino pré-programado. Os trilhos mostravam por onde eu devia andar, que rumo tomar. E eu o seguia, seguia pelo horizonte afora. E a vida era simples e fácil assim. Sem pressa e sem grandes emoções eu era levado pelos trilhos.
Até que um dia, o caminho me deu duas opções e eu não pude simplesmente me deixar guiar, eu tinha de escolher. Na bifurcação entre a emoção e a felicidade o trem descarrilhou, eu não consegui escolher e não seguir nem pra lá nem pra cá. Apavorado, tomado pelo pânico. Eu sempre segui os trilhos, o que eu faria agora? Eu iria morrer, com certeza, mas eu continuava a correr, cada vez mais rápido. Admito que tentei parar, puxei os freios de segurança, mas de nada adiantou. Talvez eu não tivesse a intenção de parar, talvez fosse algo inconsciente me dizendo pra seguir em frente.
Eu perdi os trilhos, eu me perdi. Estava sem rumo, seguindo em frente já não sei mais pra onde. Sem destino. Eu descarrilhei, tinha medo, estava ansioso, nervoso. Era tudo novo, tudo diferente. Eu não conseguia - ou não queria? - parar, e cada vez mais rápido eu seguia para lugar nenhum. Dos trilhos eu saí, eu já não precisava mais deles quando percebi para onde ia.
Eu descarrilhei? É impossível dizer isso. Eu não perdi o meu rumo, entre a felicidade e a emoção eu segui até você. Eu não descarrilhei, eu segui os trilhos do meu coração.