sexta-feira, 8 de abril de 2011

Sob a luz forte.

Estavam em um vasto salão, mesmo que não soubessem, porque tudo que viam era uma tremenda escuridão. Nada viam, mas muito ouviam e sentiam. 
Uma algazarra, era isso que se podia ouvir. Por todos os lados as pessoas - e eram muitíssimas pessoas -  gritavam: queriam saber onde estavam, quem os levou até lá, com quem estavam e coisas do género. Gritavam e gritavam.
Empurrões, era isso que se podia sentir. As pessoas empurravam umas às outras em tremendo desespero, batiam nas paredes buscando por uma saída, mas sem sucesso. Mas mantinham a esperança, se uniam e tentavam encontrar uma porta ou janela.
Com o tempo as pessoas começaram a se acalmar. Horas depois, imensas luzes se acenderam, e, num primeiro momento, todos se alegraram, mas não continuou assim por muito tempo.
A primeira coisa que repararam era uma tremenda infelicidade, assim como haviam constatado enquanto tateavam o lugar, não havia uma saída. Assim, quase toda a esperança esvaiu-se com essa constatação. Mas, como se isso não fosse o suficiente, repararam que, apesar de não haverem reconhecido pela voz, eles conheciam gente daquele lugar, repararam até que estavam unidos com seus inimigos.
Assim a luz desencadeou o caos. E, sob a luz forte, sob a tão bondosa luz da verdade, a escuridão fez falta.

Sob a luz forte.

A luz era forte. Ela quase te agredia. Você recuou e semi-cerrou os olhos quando ela te encontrou. A luz era pesada. Fora dela só existia a escuridão. Eu te pedia para se virar lentamente, observava cada canto do seu rosto.
"Agora, olhe pra mim... isso, levante a cabeça, se incline um pouco."
Os seus olhos, oh, seus negros olhos. Impossível fugir deles, olhos decididos, fortes, brilhantes. Você olha através de mim. Você me perfura. Parece estar tão longe e tão perto. Com o olhar quente, distraído mas conciso. Um olho é ligeiramente maior que o outro, a curva deles faz com que sorriam sempre. Mesmo quando chora - se é que chora. Olhos compridos, um olhar distante. Sua sobrancelha que se arquea sempre que está concentrado, acompanha o tamanho dos olhos, é quase fina, é quase cheia.
Dos seus olhos sou guiada para seu nariz, sigo a ponte e dou numa seta. A sombra me revela a delicadeza dele, é fino, é nobre. Te dá um ar mais jovem, te deixa quase arrogante. Mas ele cai bem na totalidade do seu rosto. Ele é simples, minimalista, reto. Não tem exageros e não deixa nada faltando. Dos olhos me leva à boca, uma ponte, um caminho.
Sua boca, seus lábios. Talvez sua boca seja pequena, talvez fina demais. Ela tenta se esconder, mas não consegue fugir com esse rubro, esse vermelho que a cobre, que tenta brilhar. Seus lábios sim, tem o tamanho ideal, tem carne, tem vida, tem desejo. Eles fazem uma curva leve para cima, como se você quisesse sorrir mas se segurasse. Pode sorrir.
"Adoro sua boca."
Você sorriu, claro. Depois se escondeu, mas sorriu. Seus lábios se separaram e mostraram um sorriso perfeito, brilhante, reto, feliz. Sua boca curvou-se, desdobrou-se num sorriso inocente. Seus olhos seguiram as sobrancelhas que se arquearam, quase fechados, com as marcas na pele de todos seus risos e sorrisos.
Sua pele, branca, pálida, alva. Podia-se dizer que toda a vida fora sugada de você. É tão branco, é tão cera. Sua pele é macia, mas você deixa uma barba por fazer, p'ra não parecer tão assim, tão delicado. Essa barba, com ar de desleixado. Cerrada, cobrindo seu pescoço, seu queixo. Sua pele, tão clara. Com três pintas embaixo do seu olho direito. As três marias, como eu dizia. Te dão uma nova graça, uma marca autêntica.
Você está impaciente e mordisca o seu lábio com os dentes. Joga seu cabelo p'ro lado, inquieto. Sua franja se desarruma, quase fica em cima do olho. Seus cabelos escuros quase somem nessa escuridão, posso ver sua franja que cobre metade da sua testa e os cabelos que cobrem sua orelha, nada mais. Seu cabelo, sempre comportado, achocolatado, que você teima em arrumar e desarrumar. Corrigindo o lado da franja, com medo do vento.
*click*
"Ficou linda"
Você me pede p'ra ver a foto, mas antes disso eu paro e a observo. Capturei cada detalhe seus sob a luz forte. Seus olhos de jaboticaba. Seu nariz grego. Sua boca de cerejeira. Sua barba imatura. Suas pintas. Suas marcas. Seu cabelo. Tudo condensado n'um belo diamante. Não deixei escapar nada, além de quem você realmente é.