sexta-feira, 23 de novembro de 2012

Ele observa estrelas.

Ela observava pessoas.
Ele observava estrelas.

Ela falava sobre política e jornais.
Ele falava sobre amor e poesias.

Ela fazia planos para o futuro.
Ele não sabia o que faria no dia seguinte.

Ela tomava café para ficar acordada.
Ele tomava chá para manter-se relaxado.

Ela falava sobre o palpável, o possível.
Ele sonhava com tudo que não era real.

Ela olhava para frente.
Ele olhava para cima.

Ela seguia seu olhar.
Ele disfarçava.

Ela sabia o nome das constelações.
Ele só achava as estrelas bonitas.

Ela tomou um gole de água.
Ele bebeu vinho.

Ela olhou nos olhos dele.
Ele se deteve segundos.

Ela, tímida, sorri.
Ele, feliz, retribuiu.

Há poucas estrelas no céu,
mas as prediletas dele, são as que brilham nos olhos dela,
quando ela lhe sorri.

Ele observa estrelas.

As pessoas são tão tolas, meu bem,
Algumas olham para baixo, tristes,
Outras apenas olham para os lados, julgando.
Mas as grandes coisas, estas estão acima.

Começa sempre a essa hora,
Ou talvez um pouco mais tarde,
Quando cai a noite, querida, olho para cima
E lá estão as estrelas, tantas, a brilhar.

Gosto tanto das estrelas, meu amor,
Isso vem desde pequeno,
É, eu era um desses que sonha ser astronauta.
Não sei exatamente de onde vem esse gosto,
Acho que por não ser exatamente muito atlético,
Jogador de futebol era fora de questão,
Além de sempre ter sonhado com algo mais
Ir além, meu bem, ir além.

Mas fiquei cá embaixo
E tenho de lidar com isso.
Ainda assim, quando a noite cai eu observo estrelas.
Não mais tanto por aquilo que eu pensava criança,
Amo observar estrelas pois isso é observar o passado,
E, querida, eu amo o passado.
Eu o amo pois ele é tudo que não posso mudar,
E odeio ter o poder em minhas mãos,
Deixem-me falhar, deixem-me.

Só que esse não é o principal motivo.
O principal motivo por que observo estrelas
É o fato de que elas lembram-me de ti,
Linda, brilhante, iluminada, quente.
Observar estrelas é ler tuas palavras,
O que hoje leio é o que fora há semanas
E, assim como as estrelas, meu amor,
Estás tão distante.

terça-feira, 13 de novembro de 2012

Balé.

Que bailarino que não quer dançar um solo? Ah, meu bem, eu cansei. Cansei de dançar tantos solos, querida. Tanto solo assim, pela vida. Tantos solos quanto despedidas. Estou farto de tanto dançar só. Chega de ser Don Quixote, chega de ser o príncipe que apenas busca sua princesa. Cadê minha princesa? Cadê minha parceira?
Bem, certa vez houve alguém. Que parceira! É claro que eram apenas ensaios, mas que sintonia! Que pas de deux! Que saudades de você! Sim, como sinto tua falta, pois sei que adora ver-me dançar. Sei que está vendo agora mesmo. Você fazia tudo parecer tão fácil, você me fazia sentir que voava. Você voava, sim, voava. Você, um anjo. Eu, tão só eu, sem graça, sem graciosidade, sem gracejos. Não havia como dar certo, mas quase deu.
Mas não deu. Sou um grande bailarino, sim. Mas só tenho a mim. Sim, tentaram outras parceiras, algumas ainda mais talentosas ou belas que você. De que adianta talento? De que adianta beleza? Não eram você, apenas isso. Sim, sou laureado por prêmios e prêmios. Sim, sou elogiado por coreógrafos e coreógrafos. Sim, pratico por horas e horas.
E dói, querida. Tanto tempo no estúdio. Tantas lesões. Tantas bolhas em meu pé. Meu pé é ele mesmo apenas bolhas. Eu vivo, meu bem, numa bolha. A bolha se chama você. A bolha dói. Ah, querida, como dói vê-la dançar com outros. Mas acalma meus pés o pensar que já dançaram contigo. E eu? Dancei.

Balé.

Ele dava passos firmes, passos concisos, precisos, dava meia volta, e fazia tudo de novo. 
Ela aparece, de fininho, na ponta dos pés, como se pisasse em frágeis nuvens.
Ele se vira e a nota, pára, mantem-se ereto e abre os braços. Suas pernas se movem como asas de beija-flor e ela pula nos braços dele, dão voltas sobre seus pés e sobre o chão que some por alguns instantes. 
Riem, sorriem, param devagar. Um beijo na testa, um rosto corado. 
As mãos não se soltam nem por um segundo, inquietas, conhecem-se, reconhecem-se, os dedos se entrelaçam, se cruzam, se prendem; apertos, beliscões (piscadelas).
Os lábios dela se movem rapidamente, ela para por alguns instantes, mas sempre retoma. Os lábios dele se movem devagar, hesitam, abrem por alguns instantes e fecham novamente. Os dois mordem os lábios sem perceber.
Olhar vago, perdido, evitava olhar para ela diretamente. Olhar decidido, predador, sempre encontrava os olhos dele.
Um sorriso, um riso. Que sorriso.
Ela meneia a cabeça para que ele se aproxime, ele se aproxima. Ela fala, ele fala, eles falam.
Ele se aproxima. A respiração pesada. 
Ela se aproxima. O sorriso nos lábios. 

Eles sorriem e nada mais importa.
Beliscões, mordidas, beijos, sorrisos.
Envolve-a em seus braços, cobre-a de proteção e de carinho. 
Aninha-se no peito dele, os lábios se movem devagar, mas o coração corre mais que nunca. 
Ele se aproxima mais, sorri, sorriem. Ele a observa por partes, ele a toca; a sente; a tem, ao seu lado, em seu coração, em sua memória. 

A noite dura uma vida, uma vida inflamada, vivida, que passa rápido mas deixa marcas em todas as que encontrou. 

Ele precisa soltá-la, mas suas mãos não se soltam.
Ela precisa ir embora, mas seu coração não quer, eles se despedem, se prendem, se soltam,

 as cortinas se fecham e todos aplaudem, mas elas não abrem novamente.

sexta-feira, 2 de novembro de 2012

A maré.

A maré te levou de mim.
Lhes observei, a maré e você, a se distanciar.
A maré ia para longe, ia para perto.
Você, como a maré, quase voltava para mim.
Mas iam, iam, escapavam entre meus dedos, a maré e você.
Parecia tão distante, que até valia a pena te amar, bela como a maré.
Mas logo, se enchiam, você e a maré, e estavam por toda a parte.
Até onde os olhos alcançavam, via maré, via você.

Mas, a Lua se foi, e a água ficou calma.
E, senti em minha alma, que partiram, para o céu,
ou para um fundo, para um lugar perfeito,
e depois de tudo que foi feito, percebi finalmente.

Nosso amor já não borbulha,
como a espuma da água que borbulhava quando nos conhecemos.
A maré vai e volta, mas não vai, não volta.
Se voltasse para mim,
seria outra, seria mar, céu, e um pouco menos o que era.
Mas tudo mais do que é.

Se quisesse nadar de volta para mim, nadaria.
Mas se não quisesse ir com a maré, não seria você.

As ondas não te levaram de mim.
As ondas não levam nada.
Apenas mensagens em garrafas,
e oferendas a deuses.

Eu vou e volto, mas não consigo me decidir.
Eu sinto sua falta,
e tudo que deu errado, culpo a maré de azar!

A maré.

A maré já está alta, minha querida,
E o teu amor acaba por afogar-me.
Afoga-me, meu amor, quero que afogue-me,
Pois o sentir meus pulmões inundando-se
É quase sublime como o teu toque.
És tão linda nessa noite, meu bem,
Pouco importam-me os clichês, sol e mar,
Sol e mar para o inferno, basta-me tu,
Tu, com a pele mais alva que a lua,
Tu, sempre a mover-me feito maré

Mas se vais embora,
Feito a lua some,
E descem os mares.
Não desce meu amor,
Nessa praia tão erma.

Quando a encontro novamente o amor transborda,
Ou ao menos aparenta, minha cara.
Sê minha nessa noite, linda lua,
E cá, nessa cama feita de areia
Há só sonhos e não quero acordar.
Amo as tuas bochechas, teu sorriso,
Teus cabelos, tua alegria, tu.
Mas nossas terras não tem litoral.
Nem mesmo posso ter teu amor, querida.
A maré baixa, e nada mais resta.

A água ainda existe,
Secou foi teu amor.
O sal me é ruim,
Doce é a tua boca.
Afoguei-me. Salva-me?

terça-feira, 30 de outubro de 2012

Com gelo.

Restaurante. A mesa de mogno. Uma toalha branca. Dois pratos. Talheres em pares. Duas taças e dois pequenos copos.  Diversas velas. Um vaso de flores. Rosas. Duas cadeiras de mogno. Aproximam-se três pessoas. Um rapaz, a moça e aquele que muito provavelmente seria seu garçom. O último aponta a mesa. O rapaz puxa uma das cadeiras para a moça. Agradece a ele com uma leve inclinação de cabeça e um sorriso.
O garçom pergunta o que querem. Ele começa com algo alcoólico. A moça pede apenas uma água com gelo.
Ele tem um impulso. Faz uma piada. Ela sorri. Ele pensa algo sobre não saber quais talheres usar.
Ela pensa se não deveria sorrir menos, será que ele acha que está sendo muito fácil? Não, ela não fez mais nada que ele possa interpretar mal. E está bonita? Bem, agora já é tarde de mais, não há mais nada que ela possa arrumar, se bem que poderia muito bem ir ao banheiro para dar pelo menos uma ajeitada. Mas não, eles acabaram de chegar, que tipo de mulher que vai a um encontro com vontade de ir ao banheiro? Era melhor esperar mais um pouco. Além disso ele poderia perceber que era apenas um pretexto para ver se estava bonita, e isso apenas faria com que ele ficasse com o ego ainda mais inflado. Ou talvez não, ela não o conhecia profundamente mas já sabia que ele não era do tipo que repara em algo mais que no corpo da mulher com quem saía. Era um bronco, era isso que ele era, e daí que lhe puxara a cadeira? Era o mínimo que deveria fazer, além de ser tão clichê aquele falso cavalheirismo. Verdadeiro cavalheirismo é meramente respeitá-la como indivíduo, não precisava colocá-la como princesa, estamos falando de cavalheiros, não de cavaleiros. Sim, era bonito, algo talvez até principesco, diga-se de passagem, mas isso não era o que ela esperava naquela fase de sua vida, rapazes bonitinhos eram para meninas, jovenzinhas recém-saídas da escola. Ele era sim um bronco, é bem verdade que não o conhecia intimamente, mas do pouco que viu inferiu o todo, não era boa coisa, nenhuma vez falou de algo interessante e uma das primeiras coisas que lhe perguntou foi o time para o qual torcia. Ela não gostava de futebol. É, já passara da hora de se casar, era o que diziam seus pais, às vezes ela via motivos para concordar, esse era um desses momentos em que seus pais apareciam em sua mente a repetir isso. Sim, talvez ela precisasse de alguém que apenas a entendesse, não precisava de um príncipe, de um homem saído de um romance do século XIX ou cousa parecida, tampouco de um galã de uma comédia-romântica, era um jantar e ela não queria vomitar sobre a mesa tão bem posta. Mas talvez fosse apenas esse o problema: não havia quem a entendesse. Bem, a culpa era dela então? Claro que não, sempre fora uma ótima filha e cidadã desde pequena, jamais desrespeitava os pais, na escola era a melhor da classe, sua professora de português no Ensino Médio dissera-lhe que ela iria longe, será que já chegara a essa tal terra prometida? Na faculdade, mais do mesmo, a melhor em todas matérias, orgulho da família e tudo o mais. Paralelamente fazia trabalho voluntário, todos a adoravam, a culpa não era dela. Ou talvez esse fosse exatamente o problema, era exageradamente sem graça. Não sabia, era por demais complicada.
O garçom voltou, havia esquecido do gelo.