sexta-feira, 9 de setembro de 2011

Café.

Preciso de café. Não consigo mais escrever, estou a ser derrubado por esse sono. Nada me anima, estou nessa página há horas.
Preciso escrever. Acabou meu café e não consigo continuar a pensar. Não tenho mais criatividade, ou vida, não sei, mas nada mais sai dessas outrora férteis mãos.
Preciso de criatividade. Se bem que há quem creia que não se precisa de criatividade, apenas de um escritor. Eu era um dos que acreditavam nisso. Não sei se ainda o sou. Nunca soube o que era.
Preciso saber de mim. Conheço-me em meus textos, e só. Sou o que escrevo, eu bem sei. É tão simples saber de si assim.
Não preciso de mais nada. Mas meu café acabou mais uma vez.

Café.

- Bom dia. - Disse o jovem embargado pelo sono, arrastando seus pés ao entrar no edifício.
- Bom dia, Felipe, está com sono? - Respondeu o porteiro. O garoto apenas menou a cabeça, confirmando. - Tome essa moeda e compre um café para se animar.
E antes que o garoto pudesse explicar o desgosto pela bebida, colocou uma moeda em sua mão e apontou a máquina.
Vagarosamente seguiu em direção da cafeteira, pensando que podia dar mais uma chance ao grão, afinal a última vez que tomara ainda era uma criança, e seu paladar podia mudar.
Pressionou café. Açúcar. Açúcar de novo - mesmo sabendo que é computado apenas um. Inseriu a moeda. Aguardou 1 minuto. Retirou seu café.
O vapor bailava sobre o café, e o rapaz soprava a bebida para não se queimar. Se queimou.
Soprou novamente e, com cuidado, deu o primeiro gole. Era horrível.
Olhou para Seu Mendonça, o porteiro, e sorriu. Com um gesto positivo despediu-se e entrou no elevador.
Encontrou seu chefe, que vinha do estacionamento.
- Olá, tomando um café para ter energia, vejo. - Disse com um sorriso profissional.
- Ah, sim, é bom ter disposição para o trabalho. - Falou embaralhado e tomando um gole rápido do café, para disfarçar.
E continuaram uma conversa rasa sobre os hábitos matinais pré-trabalho. E embora o menino estivesse desinteressado com a conversa e amargo com a bebida, o homem parecia estar envolvido com o diálogo; e com uma pontada de decepção disse que tinha de descer num andar antes do que desceriam, para resolver alguns importantes assuntos, mas que deveriam tomar uma boa xícara de café algum dia.
- Sim, sim, quando quiser, Senhor Carlos. - Despediu-se sem jeito, segurando a bebida com as duas mãos e tentando decifrar porque não lhe descia bem.
Ao sair do elevador jogou o copo meio-cheio no lixo.

No coffe-break tomando um Capuccino enquanto falava sobre os jogos da última rodada do Campeonato Nacional de Futebol, o jovem recém-promovido se interessa numa rapariga que lia o jornal do outro lado da sala.
- Carlos, quem é aquela? - Perguntou, acenando com a cabeça para a garota.
- Nem queira saber, Felipe, é Maria-coração-de-gelo. Todos se interessam, ninguém volta com glória. É uma devoradora de homens. - Explicou, com pesar na voz.
- Oras, derreterei seu coração com uma xícara fumegante de Macchiato, espere e verá. - Riu e foi falar com a guria.
Estatura média. Magra. Loira. Cabelos presos. Rosto fino. Sorriso curto. Olhos castanhos - de mel, como diz o clichê -. Seios pequenos. Ancas largas. Pernas compridas. Adora Macchiato.

Com duas xícaras de Mocha com a camisa dele e os cabelos soltos, sentou-se na cama.
- Ansioso para o primeiro dia, senhor Presidente? - Ela disse lhe beijando e entregando o café.
- Não queria admitir, mas sim. Foi tudo muito rápido, minha vida mudou num instante. Sinto que foi ontem que ainda era um estagiário que sempre procurava um lugar calmo para tirar uma soneca, e hoje, olha só. Presidente! De uma multinacional... Casado com uma linda mulher. Com ótimos amigos para tomar um café à tarde. Que mais eu podia querer? É realmente perfeito, sem riscos, sem surpresas, sem medos.
- Realmente, Amor, parece que foi ontem. Mas todos sabemos que você precisou batalhar para chegar onde chegou. Trabalhou. Lutou. Seguiu as regras. Você merece. - Abraçou-lhe.
- Obrigado, Querida. - Tomou um bom gole do café. - Mas estou atrasado, preciso me apressar. - Lhe beijou na testa e partiu.
- Bom dia, Felipe. Tudo que você precisa está na sala, mas sei que você dará conta do recado, caso contrário não teria passado o bastão para você.
- Obrigado, Carlos, foi um prazer ter trabalhado com você, agora vá ter seu merecido descanso. - Finalizou com abraço profissional.

Dia após dia experimentava uma variação nova de café, sempre que encontrava um exótico compartilhava com Maria e, para provocá-la, oferecia a Luisito.
- Você sabe que não fará bem a ele, é muito novo ainda para gostar de café. - Ela dizia com um tom que de sério só tinha a intenção.
- Bobagem, amo café desde pequeno. - Respondia acreditando em suas próprias palavras.
Se seus conhecidos podiam dizer alguma coisa dele seria que realmente é apaixonado por café. Espresso. Brulôt. Turco. Vienense. De todos os tipos, para todas as ocasiões. Sempre a procurar um novo aroma, um novo sabor.

Com um copo de café puro. No elevador.
Um jovem adentra o ascensor também tomando café. Soprando para não se queimar. Toma um gole e faz uma careta.
- Para se animar?
- Bom... sim, para ter forças para o trabalho. Senhor... Desculpa, não sei seu nome. - Respondeu com mais uma careta.
- Pode me chamar de Felipe. Posso lhe dar um conselho? - Perguntou tomando um gole de seu café.
- Oh, claro. A propósito, também sou Felipe.
- Pois bem, quando tinha por volta de sua idade, eu comecei a tomar café para aguentar o trabalho. E posso lhe dizer que estou onde estou hoje por conta do café, por mais estranho que isso soe. Experimentei diversos tipos e receitas da bebida, e sou um grande conhecedor, me daria bem como barista, imagino. Como ia dizendo, tomei dezenas, centenas de tipos de café, e tenho a mesma impressão do café que tive da primeira vez que bebi.
O garoto estava interessado na história do homem e mal percebera que perdeu seu andar.
- E qual é essa impressão? - Perguntou sem conseguir conter a curiosidade.
- Café é horrível. - Concluiu tomando o último gole do seu café.

terça-feira, 6 de setembro de 2011

Antiestético.

Meus dedos enroscados nos seus cabelos,
côr-de-nada, mal-tratados, emaranhados.
Sorri-me um sorriso imperfeito,
com dentes de mais.
Seu corpo, quiçá grande,
quiçá pequeno.
Seu nariz é frio,
sua mão também,
e eu não a solto.

És perfeita.

Antiestético.

É antiestético
Pensar demais.
Usar óculos, esse cabelo,
O livro na mão e essa camiseta,
Tão antiestética.

É feio
Gostar de estudar
E estudar.
Não seguir tendências
É feio.

É horrendo.
Ter preconceitos,
Julgar tanto os outros,
E não olhar para si mesmo.
É horrendo.

Mas o que é bonito?
O cabelo que todos usam?
Um poema com uma métrica tão perfeita que chega a
Doer?
Ou um poema inconsequente,
O cabelo que você decidiu gostar,
Ser como você é.
É tão bonito.



sexta-feira, 26 de agosto de 2011

Casamata.

Dia setenta e três.


Lá fora a guerra explode. Pessoas morrem, heróis nascem, traidores surgem. Mas eu estou aqui, nessa casamata que, depois desses meses já tornou-se muito mais casa.
Cá dentro tornou-se tão melancólico. Sou só eu e esse monte de suprimentos. A comida dará facilmente até o fim da guerra, mas bem que eu gostaria que ela se fosse um pouco mais rápido se eu somente tivesse uma companhia.


Dia oitenta e cinco.


Certo, não há mais salvação. Resta-me apenas ficar aqui e esperar que tudo passe, mas eu preciso de alguém. Sequer tenho acesso às notícias nesse estado em que me encontro. Será que ainda há noticiário lá fora?


Dia noventa.


Completaram-se três meses da minha vida na casamata. Resolvi pensar em tudo isso. Eu estava errado? Eu deveria ter ficado?
Ela deve estar lá fora agora. Seu nome é Fernanda. Mede 1,57m e é uma moça magra, não passando dos 44 quilos, creio eu. Apesar de franzina, Fernanda era uma garota forte. Não fisicamente, mas moralmente. Fazíamos parte de um grupo de estudantes semirrevolucionários. Ela era a líder, naturalmente. Com seus cabelos cortados à altura do pescoço era uma garota imponente, todos respeitavam aquela moça e acatavam todas suas ordens.
De certo modo, fomos nós que começamos a guerra. Éramos uma ameaça iminente à economia do país com nossos ideais libertários e igualitários. Foi por isso que o governo inventou esses atritos e fez com que o povo destruísse a si mesmo nessa falsa batalha entre nós, os "rebeldes", e grande parte da população, os "conservadores".


Dia noventa e um.


Relendo o trecho que escrevi ontem, reparei que comecei a falar sobre como tudo isso na casamata começou e acabei falando do início da guerra.
Já passava da primeira semana de conflitos. Estávamos resistindo bravamente, mas era difícil. Fernanda e eu havíamos nos separado dos demais. Em meio a toda a destruição encontramos essa casamata. Eu disse a ela que deveríamos nos refugiar na casamata, que lá estaríamos seguros. Fernanda disse-me que o povo vem em primeiro lugar. Nesse momento eu acabei cometendo o erro. Em um acesso de raiva eu resolvi descer e deixá-la ali, não podia suportar o fato de minha própria namorada me colocar em segundo plano.
Cerca de quinze minutos depois eu resolvi subir. Havia sido idiota, eu sei, ia subir e lhe pedir desculpas. O bem maior vem sempre em primeiro lugar. Ao chegar lá em cima não a avistei. Gritei por seu nome, mas Fernanda não estava mais lá. E foi assim que tudo começou.


Dia noventa e quatro.


Ao avivar essas memórias de Fernanda, tomei uma decisão. Voltarei lá para fora, batalharei junto de meus amigos. De que me importa se eu morrer? O mais importante é antes de tudo viver.

Casamata.

Não fazia mais ideia de quanto tempo estávamos no búnquer, dias, semanas,horas. Eu não aguento mais, eu vou sair, não há ninguém lá fora, por que precisamos ficar aqui, Não seja idiota, smith, lembre-se do que o sargento disse, nós não podemos nos expor, devemos esperar, eu respondi a fim de acalmá-lo, Esperar pelo quê, a guerra acabar, pelo amor de Deus, você sabe que não há ninguém lá fora, que estamos aqui sómente para não atrapalharmos, ele exclamava inquieto, Todos temos importância, até ficar nessa Casamata tem seu valor, não queira bancar o herói, O herói é aquele que não conseguiu fugir, Por isso não somos os heróis, não fugiremos, smith, ele parou por alguns segundos, como se saboreasse o que eu disse, ele olhou para o infinito e depois para os meus olhos, Você está certo, disse levantando-se, eu não vou fugir, sorri satisfeito por ter feito com que mudasse de idéia. De repente ele se levantou, correu, gritou, tentei pará-lo, ele não me ouviu, por um segundo eu pensei que estava certo, era inútil ficar aguardando uma acção do inimigo, não havia ninguém lá, o primeiro tiro cortou o ar e rasgou seu braço, o segundo perfurou sua perna, os outros incontáveis se alojaram no seu torso, em sua cabeça, ele caiu. Eu tive medo, eu continuei escondido, não podia fazer mais nada, ele estava mortinho da Silva, imagino que eles também estavam a esperar por muito tempo, tinham sede, um se levantou e foi adiante, o outro atrás, mais que um compromisso, mais que uma questão sobrevivência, em segundos dei cabo dos dois, eles mataram meu amigo, meu amigo se matou, e até segunda ordem eu continuarei nessa Casamata.

terça-feira, 23 de agosto de 2011

Cabelos.

Os seus cabelos côr de cobre não saem de minha cabeça,
o toque macio, o perfume adocicado.
Com meus dedos trançados, olhos fundo nos seus olhos.
Que brilham, refletem os meus, sorriem.
Sorriem, você toda sorri,
com seus lábios de cereja,
os quais não posso resistir.
E todo o seu corpo, seu delicado nariz - que eu adoro.
Sua cintura, suas pernas, seus braços, suas mãos.
Cada parte de ti, cada pedaço seu.
Que eu quero para mim,
que eu não posso esquecer.

(Não pude me ater apenas a seus cabelos
adoro-te toda.)