domingo, 9 de junho de 2013

Penitência.

Ele estava sentado no salão principal do convento, pensando, refletindo, orando. Os olhos pesavam, mas não conseguia fechá-los, a imagem dele lhe vinha à mente, e ele despertava, estava fraco, cansado, mas não conseguiria dormir em paz. 
Era tarde da noite, perdeu a noção de quanto tempo ficara lá, analisando sua vida, seu caminho, seus passos, não podia acreditar que foi tudo em vão.
Alguém batia à porta, batidas fortes, sofridas. 
Foi atender, se perguntava quem poderia ser, se perguntava tanta coisa. A grande porta de madeira se abriu, e lá estava ela, a causa de todos seus problemas, todas suas angústias. Seus cabelos negros totalmente desgrenhados, seus olhos cheios d'água. Ela pedia por ajuda, um lugar para passar a noite, e ele, um servo de Deus, não poderia deixá-la abandonada, não importando seus pecados, tudo que ela fizera.
Pediu que ela entrasse, que lhe explicasse o que aconteceu, por que estava assim.
Ela se atropelava nas palavras, chorava, se afogava em prantos, ele a abraçava, sentia aquela pele macia, sentia o perfume que vinha dela. Sabia que não devia, mas se sentia bem de tê-la aos seus braços, de ser a única saída que ela encontrou.
Ela se atropelava nas palavras, dizia que queria mudar, que não enganaria mais seu esposo, seu amor. Não enganaria mais a si mesma, não era isso que ela queria, queria ser feliz, queria conseguir colocar a cabeça no travesseiro e dormir em paz. Não queria se arrepender todas as noites das traições, não queria rezar o dia todo por perdão. 
Ela se atropelava nas palavras, lhe contou como falou ao marido de toda sua infidelidade, mas sabia que ele perdoaria, era um homem de bom coração, queria ser feliz com ela, sabia que a sinceridade seria maior que qualquer pecado, a sinceridade seria maior que qualquer erro. Erro. Errou. Errada. Ele mandou pegar suas coisas e sumir de sua frente, ir embora naquela mesma hora. Ela implorou por perdão, chorou, se ajoelhou, implorou por perdão, se mostrou arrependida, chorou e implorou por perdão. Mas ele estava decidido, traição era demais. E ela foi, sem outra saída, teve de sair. Não sabia para onde ir, os outros homens que entraram em sua vida não lhe acolheriam. Então pensou nele, no frei, que tanto lhe queria bem. E até lá ela foi, chorando, implorando por perdão.
Passou a noite lá, no quarto dele. Ele dormiu no salão principal, quase não dormiu, pensando nela, ela, em sua cama. Sua pele macia enrolada em seus lençóis. Não dormiu, pensando nela, ardendo.
Todos no convento lhe acolheram, lhe deram um quarto de hóspede e disseram que poderia ficar quanto tempo precisasse, e ela precisava disso, tempo, tempo, tempo.
Uma semana passou, ela continuava cansada, triste, chorosa. Mas estava feliz por ter sido tão recebida, pelo carinho e pelo afeto, pelo amor que todos tinham para com ela, principalmente do frei que tanto que lhe queria bem, que abriu as portas para ela.
E no sétimo dia, quando todos ceariam juntos, ele foi procurá-la, bateu à porta mas ela não atendia, tentou abrir, abriu. Suas roupas estavam jogadas na cama, ouvia o chuveiro, se aproximou da porta do banheiro, ela cantarolava, estava melhor. Ele ia esperar fora do quarto, mas pensou consigo mesmo que essa seria a chance que ele sempre quis, de vê-la, de saciar seu desejo, aproximou-se da porta, agachou-se.
Via seu corpo desnudo pela fechadura da porta, as curvas lascivas, como a desejava. Como a queria. Entendia o pecado, entendia como podiam fazer o errado, ele estava pecando, ele estava errado. Errado por pensar nela todas as noites. Por trair a igreja, por se trair. Ela dançava por trás da névoa da água quente, como se dançasse por trás de véus, como se dançasse para ele. E ele enlouquecia. Seu corpo fervia, abriu sua batina, e como estava errado, como pecava. Não se importava, toda sua fé estava quebrada, o ceticismo era cada vez mais duro, ele não sabia o que fazer, balançava de um lado para outro, tinha medo de pecar, mas pecava e como era bom, ele balançava de um lado para o outro, e sua duvida derreteu em suas mãos, os olhos fechados, agradecendo a deus. Era tão bom, o pecado, era tão bom, regojizou. Ela notou algo estranho, ele não.
Se cobriu e abriu a porta. Ele estava lá, pecaminoso, sujo. Ela estava lá, traída, violada. Saiu correndo, pedindo ajuda, o acusando. Ele errou, assumiu o erro, a culpa, o pecado.
Foi expulso. Recolheu suas coisas, foi embora.
Ela foi expulsa, não tinha mais lar, não tinha paz. Estava pagando por seu erro.
Ele foi expulso, foi para casa, finalmente em paz. Estava pagando por seu erro.

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